Na despedida de Lisboa, Pádua lembra tradições do TJ-PB: austeridade, decência, operosidade, independência, imparcialidade, competência, responsabilidade e cultura
por Evandro da Nóbrega,
coordenador de Comunicação Social do Judiciário paraibano
Presidindo a sessão solene do Tribunal Pleno da manhã desta quarta-feira, 19 de março, em que se despediu do TJ-PB o desembargador José Martinho Lisboa, o chefe do Poder Judiciário, desembargador Antônio de Pádua Lima Montenegro, afirmou entre outras considerações que, "diante da realidade irreversível que estamos a viver, não posso negar, meu caro Desembargador Martinho, que, na qualidade de Presidente deste Tribunal, mas acima de tudo como seu amigo e colega, eu sinto, no âmago do coração, um travo irreprimível de tristeza e nostalgia pelo vazio imenso que vai provocar a sua ausência deste Plenário".
¿ Não mais teremos suas intervenções oportunas, sábias, prudentes, muitas vezes decisivas para que aqui se fizesse a melhor Justiça ¿ expressou também o desembargador-presidente Antônio de Pádua, acrescentando: "A experiência que [Vossa Excelência] adquiriu e os conhecimentos que ampliou aqui, ao longo de quase dezoito anos de judicatura, vão fazer muita falta e aumentarão mais ainda a responsabilidade dos que ficam. Todos nós somos legatários de cento e dezesseis anos de tradição de austeridade, decência, independência, imparcialidade que recebemos de nossos antecessores. Não podemos trair nossos maiores".
O presidente do TJ-PB fez questão de frisar que, "Graças a Deus, a Magistratura da Paraíba que Vossa Excelência e todos nós, mais antigos, ajudamos a formar, a forjar e a purificar no cadinho da compostura, da decência, da dignidade profissional e pessoal, da cultura, nos deixa tranqüilos de que nosso Tribunal e o Poder Judiciário do Estado continuará trilhando pelos rastros de luz que Juízes como Vossa Excelência deixaram à sua passagem pela Judicatura Estadual".
E o desembargador-presidente não deixou de aludir à sua própria aposentadoria, a ocorrer num futuro relativamente próximo:
¿ Por isso, à medida que se aproxima o dia de minha partida pela aposentadoria, vou recitando o meu Nunc Dimittis, como Velho Simeão no Mistério da Apresentação do Senhor: Agora, Senhor, podeis deixar partir em paz o vosso servo, porque meus olhos vêem u'a magistratura jovem, operosa, competente, responsável, independente e culta, que garante a perpetuidade da Justiça em nosso Estado.
ÍNTEGRA DO DISCURSO DO PRESIDENTE
É o seguinte o inteiro teor do discurso do desembargador-presidente Antônio de Pádua Lima Montenegro ao se despedir do desembargador Martinho Lisboa:
"Meu caro amigo e colega, Desembargador José Martinho Lisboa: Seu perfil já foi traçado, com a proficiência habitual, pelo Desembargador Marcos Cavalcanti de Albuquerque, pela Doutora Janete e pelo Doutor Johnson Abrantes. Apenas um acréscimo ao que disse o nosso colega, Desembargador Marcos: falta no currículo de Vossa Excelência a anotação da Medalha da Ordem do Mérito Judiciário da Paraíba, a condecoração mais importante que lhe foi outorgada por este Egrégio Tribunal.
Fluía o ano de 1966, mas parece que foi ontem. Há quarenta e dois anos, alguns jovens Bacharéis, muitos dos quais com menos de trinta anos de idade, eu e Vossa Excelência entre eles. Ocupávamos carteiras em uma sala de aula, no primeiro andar da Academia de Comércio Epitácio Pessoa, logo ali, no início da Rua das Trincheiras, a fim de realizar as provas escritas do concurso de Juiz de Direito. Presidia a Comissão o Desembargador Osias Nacre Gomes, Vice-Presidente deste Egrégio Tribunal, composta pelos Desembargadores Francisco Espínola e Aurélio de Albuquerque, além do Professor Agnello Amorim Filho, representante da Ordem dos Advogados do Brasil. Fomos aprovados.
Formado em 1963 pela nossa sempre querida Faculdade de Direito da Universidade Federal da Paraíba, e advogado da Federação dos Trabalhadores do Estado da Paraíba, Vossa Excelência obteve a primeira colocação. Eu, formado em dezembro de 1965, jejuno em prática forense, fiquei no décimo lugar. No dia 17 de dezembro de 1966, foi Vossa Excelência nomeado Juiz de Direito da Comarca de Serra Branca, de primeira entrância, no cariri paraibano. Fui o oitavo nomeado: 28 de fevereiro de 1967, para a Comarca de Conceição, no alto sertão da Paraíba. Ambos tivemos a fortuna de ser nomeados pelo Governador João Agripino Filho, um dos maiores governantes paraibanos de todos os tempos.
Embora não tivéssemos ainda laços mais estreitos de amizade, dispôs a Providência que eu seguisse algumas de suas pegadas. No dia 03 de março de 1967, foi Vossa Excelência removido para a Comarca de Alagoinha. No dia 12 de abril seguinte, o sucedi em Serra Branca.
Estava eu ainda em Serra Branca, quando Vossa Excelência foi promovido, por merecimento, para a Comarca de Princesa Isabel, de segunda entrância, a 23 de janeiro de 1969. A 24 de abril seguinte, foi removido para a Comarca de Monteiro, na região do cariri, onde eu ainda me encontrava. Pouco depois, a 10 de junho, foi removido para Sapé. A 14 de agosto fui promovido, também por merecimento, para a Segunda Vara da Comarca de Sousa. Daí me removi para Picuí, a 07 de outubro. No dia 19 de maio de 1971, Vossa Excelência foi removido para o Juizado Substituto da Comarca da Capital, enquanto que eu, no dia 25 de agosto, me removi para a Comarca de Areia.
No dia 24 de julho de 1973, Vossa Excelência foi promovido para a Sexta Vara da Comarca de Campina Grande. No dia 24 de outubro seguinte, fui o seu sucessor no Juizado Substituto da Capital, pelas mãos do Presidente, Desembargador Simeão Cananéa, meu amigo-irmão e meu guru. A 16 de março de 1979, foi Vossa Excelência removido para a Sexta Vara da Comarca da Capital. No dia 29 de novembro, fui promovido para a mesma Sexta Vara de Campina Grande pelo grande Governador Tarcísio de Miranda Burity e, logo em seguida, 04 de dezembro, removido para a Quinta Vara da Capital, mediante permuta com o inesquecível Juiz de Direito Sylvio da Silva Torres, graças a valiosa articulação do então Juiz de Direito Antônio Elias de Queiroga. Não me canso de agradecer a estes dois insignes magistrados pelo gesto fraterno e magnânimo com que me agraciaram.
A 17 de dezembro de 1990, foi Vossa Excelência promovido a Desembargador, pelo critério de merecimento. Recebi, honrosamente, o seu voto nos escrutínios consecutivos de 1992, quando obtive treze dos quatorze votos dos Desembargadores aptos a votar, sendo promovido o Desembargador Plínio Leite Fontes; de 1994, quando doze dos quatorze Desembargadores sufragaram o meu nome, sendo promovido o Desembargador Marcos Otávio Araújo de Novais, depois de três indicações consecutivas; e 19 de junho de 1996, obtendo novamente doze dos quatorze votos dos Desembargadores aptos a votar, sendo também promovido, por merecimento, depois de indicado três vezes consecutivas. No momento de minha investidura, acompanhavam-me Vossa Excelência, meu colega de concurso, e o Desembargador Marcos Otávio Araújo de Novais, colega dos velhos tempos do Seminário Arquidiocesano. Saudou-me o Desembargador Júlio Aurélio Moreira Coutinho, meu ex-professor no Liceu Paraibano e meu fraternal amigo.
Em dezembro de 1999, fui eleito Vice-Presidente deste Egrégio Tribunal, integrando a Mesa Diretora do biênio 1999-2001, de que era Vossa Excelência o Presidente, e o Desembargador João Antônio de Moura o Corregedor Geral. A integração dos integrantes deste biênio de ouro era tal que eu costumava dizer que formávamos a Santíssima Trindade, três em um.
Nos momentos difíceis aqui vividos por mim, Vossa Excelência esteve sempre solidário comigo. Não posso esquecer do voto precioso que recebi de Vossa Excelência naquele dia 17 de dezembro de 2003, quando se tentou, diabolicamente, impedir a minha eleição para o Tribunal Regional Eleitoral, na categoria de Desembargador.
Vossa Excelência foi um dos quatorze dos dezoito Desembargadores que, enfrentando e malogrando a trama sinistra, sufragaram meu nome, proporcionando-me consagradora vitória. Não menos decisivo foi o seu apoio discreto, firme e decidido, ao lado do Desembargador Plínio Leite Fontes, que então presidia este venerando Tribunal, e do Desembargador Raphael Carneiro Arnaud, quando se tentou, insensatamente, impedir que me empossasse como Juiz daquela Colenda Corte de Justiça, na tarde-noite, memorável para mim, de 09 de fevereiro de 2004. Ao meu lado, apoiando-me, estavam Vossa Excelência e Dona Carmi na tarde de 26 de fevereiro do mesmo ano quando, por maioria de votos, fui eleito e empossado Presidente do Tribunal Regional Eleitoral.
Sempre solidário comigo, Vossa Excelência atuou, mais uma vez, decisivamente para abortar nova tentativa que se ensaiou a fim de impedir minha eleição para a Presidência deste Egrégio Tribunal. Em votação aberta, muito bem articulada pelo Decano, Desembargador Raphael Carneiro Arnaud, fui eleito pelo sufrágio unânime e declarado de todos os meus colegas Desembargadores, a quem muito agradeço, juntamente com os Desembargadores Genésio Gomes Pereira Filho, Vice-Presidente, e Júlio Paulo Neto, Corregedor Geral. Para manifestar-lhe minha gratidão e reiterar-lhe a minha amizade, o escolhi para proferir o discurso de saudação desta Colenda Corte na solenidade memorável de minha posse, em praça pública, naquela tarde-noite de primeiro de fevereiro de 2007, quando a lua cheia brilhava no céu de nossa Capital.
Creio não ter sido importuno, ou inoportuno, fazer esta retrospectiva. Desnecessário seria pronunciar-me, uma vez que, presidindo o Tribunal, designei o colega Desembargador Marcos Cavalcanti de Albuquerque como porta-voz do Colegiado nesta sessão solene de sua despedida deste Tribunal. Considerei, no entanto, que era preciso registrar esses fatos e datas, até como contribuição à história de nosso Tribunal.
Vossa Excelência mesmo encarregou-se de afastar qualquer sinal de tristeza em suas despedidas. Ontem, na Câmara Criminal, afirmou, otimista, que se sentia em festa; sem qualquer sinal de cansaço, vivenciando, serena e tranquilamente, este momento singular de sua vida. Acima de tudo, afirmou considerar-se um vitorioso, porque soube constituir uma belíssima família e construir u'a carreira magnífica, lastreada na justiça e na lealdade, tendo ocupando todos os cargos possíveis da Magistratura. É a consciência do dever cumprido, de haver contribuído com inexcedível zelo para o engrandecimento, prestígio e respeitabilidade do Poder Judiciário do Estado da Paraíba.
Subscrevo todos os conceitos e palavras dos colegas Desembargadores Joás Filho, Nilo Ramalho, Leôncio e Antônio Carlos na Câmara Criminal, e Marcos Cavalcanti de Albuquerque, a quem confiei a nobre tarefa de falar em nome desta Corte de Justiça, assim como da Doutora Janete Macedo, Procuradora Geral de Justiça, e do Doutor Johnson Gonçalves de Abrantes, representante da Ordem dos Advogados do Brasil.
Diante da realidade irreversível que estamos a viver, não posso negar, meu caro Desembargador Martinho, que, na qualidade de Presidente deste Tribunal, mas acima de tudo como seu amigo e colega, eu sinto, no âmago do coração, um travo irreprimível de tristeza e nostalgia pelo vazio imenso que vai provocar a sua ausência deste Plenário. Não mais teremos suas intervenções oportunas, sábias, prudentes, muitas vezes decisivas para que aqui se fizesse a melhor Justiça. A experiência que adquiriu e os conhecimentos que ampliou aqui, ao longo de quase dezoito anos de judicatura vão fazer muita falta e aumentarão mais ainda a responsabilidade dos que ficam. Todos nós somos legatários de cento e dezesseis anos de tradição de austeridade, decência, independência, imparcialidade que recebemos de nossos antecessores. Não podemos trair nossos maiores.
Graças a Deus, a Magistratura da Paraíba que Vossa Excelência e todos nós, mais antigos, ajudamos a formar, a forjar e a purificar no cadinho da compostura, da decência, da dignidade profissional e pessoal, da cultura, nos deixa tranqüilos de que nosso Tribunal e o Poder Judiciário do Estado continuará trilhando pelos rastros de luz que Juízes como Vossa Excelência deixaram à sua passagem pela Judicatura Estadual. Por isso, à medida que se aproxima o dia de minha partida pela aposentadoria, vou recitando o meu Nunc Dimittis, como Velho Simeão no Mistério da Apresentação do Senhor: Agora, Senhor, podeis deixar partir em paz o vosso servo, porque meus olhos vêem u'a magistratura jovem, operosa, competente, responsável, independente e culta, que garante a perpetuidade da Justiça em nosso Estado.
Dileto amigo e colega Desembargador José Martinho Lisboa: estamos diante de uma realidade cruel: Vossa Excelência está deixando o nosso convívio! Repito as palavras que proferi quando da aposentadoria do nosso amigo e colega comum, Desembargador Raphael Carneiro Arnaud: Constrange-me fundamente ser compelido a anunciar-lhe, sem meias palavras, que a marcha irreversível, inexorável e cruel do tempo sinaliza que é chegada a sua hora de partir, de que é preciso abandonar, em definitivo, a cátedra judicante que vem titulando, com invulgar proficiência e admirável honradez, na distribuição de Justiça aos seus concidadãos durante quase dezenove anos.
Certamente vamos encontrar-nos, vez por outra, aqui ou fora daqui, mas não o veremos mais ocupando uma das cátedras judicantes nas salas de sessões da Câmara Criminal ou do Tribunal Pleno, relatando, votando, revisando os feitos submetidos à sua apreciação, e delicadamente aparteando seus colegas. Não mais assistiremos às calorosas discussões sobre temas e teses palpitantes de Direito Penal e Processo Penal com os Desembargadores Leôncio, Nilo, Antônio Carlos e Joás Filho. Sentiremos muita falta do Desembargador sábio, seguro, prudente, por vezes veemente, na defesa de teses que, na sua ótica, melhor expressavam o bom direito!
Vossa Excelência disse ontem que se sentia em festa e, realmente, preparou com esmero sua despedida. Tem uma família bem constituída, ao lado de Dona Carmi, esposa digníssima, mãe de seus filhos Vânia, Mônica e Herbert, seus genros, nora e netos. Ocupou, como disse, todos os cargos possíveis na Magistratura. Goza de perfeita saúde, está inteiro, física e mentalmente saudável.
Por tudo isso, genuflexo diante da Majestade de Deus que o cumulou de bênçãos ao longo de sua vida pessoal e profissional deve cantar seu hino de ação de graças. Nada melhor para fazê-lo do que recitar, com o autor sagrado, estes versículos do Salmo 70: Senhor, sois minha força e meu amparo, o meu refúgio, proteção e segurança! Porque sois a minha esperança, ó Senhor Deus, minha esperança, em vós confio desde a minha juventude! Sois meu apoio desde antes que eu nascesse, desde o seio maternal, o meu amparo: para vós o meu louvor eternamente! Vós me ensinastes desde minha juventude e até hoje canto as vossas maravilhas. Não me deixeis quando chegar minha velhice, não me falteis quando faltarem minhas forças!
A sessão está encerrada e todos estão convidados a se dirigir ao Salão Nobre onde será feito o lançamento do livro Martinho Lisboa, com muita honra, da autoria do Juiz José Herbert Luna Lisboa, filho do homenageado, além do documentário e do coquetel que será oferecido pelo Desembargador Martinho. Muito obrigado a todos pela honra da presença."
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