Carine Labres fala sobre preconceito e a nova postura do juiz contemporâneo
Na noite dessa quinta-feira (7), com o tema “Jurisdição e Resistência”, a juíza Carine Labres, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, proferiu palestra à comunidade jurídica e acadêmica do Estado dentro do projeto “Café com Lei”. O evento, realizado no auditório da instituição de ensino, foi aberto pelo juiz Marcos Coelho de Salles, da 1ª Vara da Fazenda Pública da Capital.
Essa é a terceira edição do projeto que é uma iniciativa da Escola Superior da Magistratura (Esma) e tem o intuito de informar a sociedade sobre os assuntos que estão mais em pauta na área do Direito no país.
Durante a conferência, a palestrante convidou a todos a uma reflexão sobre as situações absurdas produzidas pelo preconceito, que contamina ações e interfere em resultados, bem como chamou a atenção para a responsabilidade social dos juízes na transformação da realidade social.
"A sociedade e o nosso ordenamento jurídico não podem mais manter-se fechados e ignorar que a homossexualidade é um fato social, que cresce a cada dia e que jamais deixará de existir. O Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade social que se desenha, notadamente no que concerne à violação de direitos, cuja profanação afeta o mais íntimo aspecto da vida privada das pessoas", disse a palestrante.
Em relação à homossexualidade, Carine Labres ressaltou que os profissionais do Direito, não podem tratar as questões que envolvem a sexualidade de forma moralista. Para ela, é preciso pensar e repensar a liberdade sexual acima dos conceitos estigmatizantes que servem, única e exclusivamente, de instrumento de exclusão.
"Que ódio pode gerar, em pleno século XXI, uma demonstração de amor entre duas pessoas, do mesmo sexo ou não? Por que a homossexualidade escandaliza mais que a homofobia? Afinal, qual a razão de tamanha intolerância?", questiona.
A juíza afirmou que a intolerância e o preconceito são problemas do nosso tempo, que desafiam a sociedade e colocam em questão nossa capacidade de tratá-los racionalmente. "Como seres humanos, devemos tomar consciência de nossos preconceitos em busca de um crescimento como indivíduos", defende.
Carine Labres realizou, em março de 2014, o primeiro casamento coletivo, com a participação de 56 casais, dos quais um era homossexual, no Foro de Santana do Livramento (RS). Na segunda cerimônia, no Centro de Tradições Gaúchas Sentinelas do Planalto, o local foi alvo de incêndio criminoso por parcela conservadora do tradicionalismo gaúcho. Diante da impossibilidade da utilização do CTG, a juíza celebrou o casamento no Tribunal do Júri.
"O casamento homossexual é tão legítimo quanto o casamento heterossexual, simplesmente porque ambas decorrem de atos consentidos entre adultos", assegurou.
Para a palestrante, não mais se concebe conviver com a exclusão e com a discriminação em um Estado que se quer Democrático de Direito. "A resistência em rever conceitos tão conservadores no Direito e na sociedade, tidos como verdade absoluta, tal como a inércia perene do juiz, impede o avanço da ciência jurídica, que deve ser protagonista em consolidar direitos, em especial o dos excluídos e condenados à invisibilidade", ressaltou.
Por fim, a juíza Carine Labres afirmou que o Judiciário, ao lado dos demais poderes do Estado, é tão responsável quanto os demais pela consecução dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.
"O juiz, que compreende a dimensão de sua responsabilidade social, pode e deve desempenhar a tarefa de dirimir conflitos de modo socialmente mais justo, cumprindo papel distinto do juiz legalista-positivista criado pela Revolução Francesa para ser la bouche de la loi", assegurou.
Destaque - A juíza Carine Labres ganhou destaque nacional por suas decisões firmes em Defesa dos Direitos Humanos. Em 2013, reconheceu o direito de duas crianças terem os registros civis alterados para inclusão da segunda mãe nas certidões, flexibilizando a norma para contemplar uma questão socioafetiva.
Ela também foi uma das homenageadas do Prêmio Humanidades 2014, promovido pelo Instituto Brasileiro de Pessoa, por sua postura na defesa dos direitos das minorias.
Por Marcus Vinícius